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Quando eu voltar a ser criança. São Paulo: Summus,1981.


"Fico imaginando que sou um professor. Reúno uma porção de pessoas e digo: ? É preciso construir uma boa escola. Uma que não seja apertada, para a gente não precisar se empurrar, pisar um no outro, esbarrar. As crianças chegam à escola, e eu pergunto: ? Adivinhem o que vamos fazer? Um responde: ? Vamos fazer uma excursão. Um outro diz: ? Vai ter projeção de filmes. Falam isso, falam aquilo. E eu: ? Não, não. Tudo isso vamos ter também, mas além disso teremos coisa mais importante. E só quando se tiverem acalmado anunciarei: ? Vou construir uma escola para vocês. Invento, então, diversos obstáculos. Por exemplo: a escola, já quase pronta, desaba ou pega fogo. Precisa começar tudo de novo; mas só para chatear, construo uma que será melhor ainda. Sempre imaginei tudo com obstáculos. Quando viajo de navio, há uma tempestade. Se sou um chefe guerreiro começo sofrendo derrotas, e só no final conquisto a vitória. Porque quando tudo sai bem desde o início, a coisa fica chata. Mas então ao lado da escola há uma pista de patinação. Temos quadros, mapas, instrumentos, aparelhos de ginástica, animais empalhados. Chegam as férias, mas na porta da escola reúnem-se meninos e meninas que gritam: ? Deixem a gente entrar! Não queremos férias, queremos ir à escola! O contínuo fica discutindo com eles, mas não adianta. E eu fico no meu gabinete, não sei de nada, porque estou preenchendo uns papéis. Mas eis que chega o contínuo. Ele bate na porta, e eu digo: ? Pode entrar. E ele: ? Senhor diretor, as crianças se rebelaram, não querem férias. Respondo: ? Não se preocupe, vou logo acalmá-las. Chego à porta. Estou sorrindo. Não estou zangado. Explico: Férias são férias. Os professores precisam descansar. Porque quando estão cansados ficam irritados e gritam com as crianças. Conversa vai, conversa vem, concluímos: eles podem vir brincar no pátio, mas terão de se responsabilizar de que não haverá bagunça."